segunda-feira, 11 de março de 2013

Os feios são belos

A menina de coxas desproporcionais
e espinhas recém-curadas não sabe,
mas está sendo observada.

Seus olhos presos ao chão,
procurando sabe-se lá o quE,
os cabelos deliciosamente desgrenhados,
ela nem imagina, nem quer saber,
que está sendo observada,
porque se acha feia demais
pra que isso aconteça.

Os feios são belos
pois deixam suas afetações
em casa.
Sabe aquela vontade de ser visto,
notado, amado, invejado?
Pois bem, os feios deixam essas coisas
em casa.

Então eles, os feios,
enfiam suas caras injustamente desprezadas
entre cabelos mal cuidados,
travesseiros mal amados
e noites mal dormidas,
pois o peso da sociedade dita bela
e o bafo da pose dos ditos lindos,
invadem o quarto dos feios com tanta força
que fica muito difícil dormir
com a barulheira
desses ditos
belos.

Os belos são barulhentos,
pavões gritantes de umbigos enormes,
“Vejam-me!”,
“Admirem-me!”,
“Olhem-me fazendo pose no Instagram!”;
as penas no chão acusam:
aqui esteve o belo.

Louvemos a beleza dos feios, dos imperfeitos,
aqueles que se levantam da cama e, sem artificialismos,
metem a cara na rua e pregam os olhos no chão.

Olhemos os feios.

E a menina de gestos oprimidos
do começo do poema,
aquela toda envergonhada,
meio que se punindo por ser quem é,
lembra dela?

Foi-se embora sem saber
que estava sendo admirada.


(Michel Consolação)

Ela vomitou

borboletas mortas.



o fim do amor é terrível.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Eloísa Gonçalves, 23 de fevereiro de 2013

(...) o teu beijo chegando por outras bocas, outros lábios, outra línguas; teu nome trocando de letras, sílabas, de lugares; tuas palavras indo por outros ventos, pintando os mesmos papéis; teus dedos imprimindo outras digitais sobre a mesma pele; teus outros gestos cobrindo o mesmo rosto, tampando os mesmo olhos; teu ombro acolhendo meu queixo como nunca, sem encaixar; teu nariz navegando por entre pernas mais finas, bonitas; teus pés caminhando sem saber os passos que darão e em qual direção irão. Sem nunca partir, sem nunca ficar.

castanho-claro


Charles Bukowski

quarta-feira, 6 de março de 2013


Um corpo quer outro corpo.
Uma alma quer outra alma e seu corpo.
Este excesso de realidade me confunde.
Jonathan falando:
parece que estou num filme.
Se eu lhe dissesse você é estúpido
ele diria sou mesmo.
Se ele dissesse vamos comigo ao inferno passear
eu iria.
As casas baixas, as pessoas pobres,
e o sol da tarde,
imaginai o que era o sol da tarde
sobre a nossa fragilidade.
Vinha com Jonathan
pela rua mais torta da cidade.
O Caminho do Céu.

Adélia Prado